“Eu sou Nordeste”. É assim que ele se define por aí, em sites de relacionamento, com essa frase de tanto peso e poesia. Dá até uma invejinha, uma vontade de fazer parte dessa região, mais especificamente de Natal, donde brotam esses “real cute hardcore boys”. São Paulo que se cuide.
Vocalista das recentes Todos Contra Um e Sailor Edge, Diego é um rapazote de 19 aninhos, cheio de tatuagens e pronto pra explodir pela cena hardcore. Suas bandas estão no começo, ainda não têm álbuns lançados, mas já são dois projetos paralelos que prometem se destacar pelo posicionamento libertário, moderno e destemido. Todos Contra Um aborda diversos assuntos, entre os quais o feminismo, a homofobia, o aborto, a exploração do homem pelo homem, o consumo consciente, o vegetarianismo.
São músicas como “Levantando Seu Ego”, “Vivendo e Desaprendendo”, e um destaque para “Tentar mudar por dentro”, uma das melhores letras, metralhadora de verdades, que promete transgredir até na duração da faixa, provavelmente bem mais longa que de costume na cena punk/hardcore. Digo “provavelmente” porque ainda é inédita, mas o Caralho já divulga um trechinho:
"Quando iremos ser realmente livres? / Sem preconceitos nem divisões? / Quando iremos acabar com os padrões, / os seus costumes, suas tradições? / Ainda olham torto para vários negros nas ruas, / vários travestis são violentados em praças públicas, / animais ainda são mortos só para satisfazer seu paladar, / o aborto ainda é considerado um crime, e não um direito das mulheres, / ainda existem barreiras para o conhecimento e as idéias, / várias mulheres são espancadas a cada minuto que passa. / As idéias nascem livres e assim tem de continuar. / Humanos ainda exploram animais visando o seu lucro e prazer. / Todos temos direito a moradia, mas isso na prática não é verdade. / Muitos civis morrem em guerras, que eles nem sabem por que estão nelas. / Marcha pacífica pela legalização da maconha é proibida. / Muitos trabalhadores ainda estão sem teto".
Lendo as últimas frases, me veio até uma dúvida, pois é comum achar que uma postura vegana ou straight edge seja “contra” drogas, mas o Diego mesmo responde:
“Quem é sxe não se droga, mas isso não quer dizer que eu seja contra quem se droga, ou contra as drogas, cada um faz o que quiser com sua vida, tenho milhões de amigos que se drogam, e nem por isso eu deixo de sair com eles, nem passo a gostar menos deles, nem nada do tipo. [...] Eu já usei drogas, mas hoje em dia eu não uso. O que acho mais errado são essas leis sempre tentando ditar o certo, e dizer quem está errado, prontas pra punir a todo custo. [...] Acho a maconha uma planta normal, que é usada de formas medicinais até hoje. É usada também para fazer roupas, entre outras coisas, é uma parada que a natureza deu pra gente, quem a usa pra sair do seu estado normal... só por sair mesmo... não posso fazer nada, cada um com a sua sentença, não estou aqui pra julgar ninguém, cada um tem sua mente, que é seu próprio juiz. [...] A maconha é algo que sai da terra, é uma planta, cada um faz o que quiser com ela [risos]”
A cena rock em Natal, segundo o próprio Diego, é bem movimentada, sinal de que o Nordeste há muito tem muito o que mostrar. O problema é “só a cena hardcore, um pouco mais parada”, e a queer, quase inexistente. Diego (ou xdiegox, numa alusão ao movimento straight edge – sxe) é um dos raros transgressores – eita moço predestinado! Ele até se aventurou numa banda queercore, a divertida Silva Saint vs Rocco, mas os ventos o levaram pra outros lados, e a banda parou por tempo indeterminado. Também não preciso explicitar sua sina para um sexy symbol. Mas ele desconversa quando indagado sobre “groupies” e admiradores. Rapaz discreto, rara qualidade. Natal, aí vamos nós!